sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Um líder sem liderança


“Não adianta chamar de volta;/A palavra que do peito fugiu;/Não se retém a flecha,/Depois que do arco saiu”. Assim dizia o poeta e dramaturgo, Pietro Metastásio (1698-1782).

Na semana passada, o senador Aloizo Mercandante afirmou que deixaria a liderança do PT no Senado e que sua decisão era irrevogável. Mas o mundo político revela que nem sempre as máximas são capazes de se sustentar em um cenário onde a verdade pode não durar 24 horas.

Ao recuar da decisão “irrevogável”, o senador “rasgou” o dicionário mostrando que as palavras - para os políticos - são meros vocábulos sem consistência e durabilidade. Ao anunciar que sua decisão era de caráter irrevogável, ou seja aquilo que não se volta atrás, havia criado um cenário simbólico para sua própria trajetória política.

Mas nesta quinta-feira, o senador subiu a tribuna do Senado para mostrar a inconsistência de suas palavras e curvar-se aos interesses do Planalto.

O ganho político do Governo é inquestionável. Manteve intacta a figura simbólica de Mercadante e afastou o simbolismo de uma renúncia ao posto, o que certamente traria mais um arranhão históricos para a legenda.

Já se foram Cristovam Buarque, Tilden Santiago e Marina da Silva (a caminho do PV). Mercadante havia tão somente anunciado deixar a liderança, mas a perda de prestigio e a falta de sintonia com as condutas da Executiva delineariam um caminho sem volta.

Mas se para o Governo o recuo foi frutífero, para a figura política de Mercadante, sucumbir-se aos interesses do Planalto, parece não colher frutos tão doces. Ficou a imagem da fraqueza e da dificuldade de se desgarrar do Poder. Perdeu-se o discurso e o poder de articulação.

Não há como negar que a própria liderança ficou comprometida diante de um partido “rachado” entre as posições históricas em defesa da moralidade pública e os interesses da governabilidade. A imagem é de um líder sem capacidade de defender e articular suas próprias convicções, submisso aos interesses do Planalto.

Sem discurso, Mercadante demonstra a capacidade engolir estratégias políticas que avalizam condutas que eram alvo de sua fúria verbal. No dia-a-dia das articulações ficou com dificuldades de negociação com os setores peemedebistas nos quais mirou suas palavras há algumas semanas. O dialogo com José Sarney não será o mesmo.

Na outra ponta, a interlocução com setores oposicionistas também não passará sem arranhões. A imagem de um líder submisso e incapaz de manter-se firme as suas palavras terá reflexos.

O líder perdeu a liderança e comprometeu sua imagem. Mas em política a verdade de hoje pode não ser a mesma de amanhã.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

É dando que se recebe


Moeda de troca é alimento para muitos políticos enraizados no fisiologismo puro. Mas se a prática é nefasta a democracia e aos interesses públicos, o método colhe frutos para muitos que transitam pelos corredores da vida pública.

A Lei que concede aos templos religiosos a isenção de IPTU é a evidência mais nítida deste jogo político. Enviado pelo Governo à Câmara, atendeu aos apelos políticos do vereador Enéias Rezende (PRTB), que tem na sua base o eleitorado evangélico.

Eleito numa coligação oposicionista e testemunha de acusação em processo contra o Governo, o perfil de Enéias mudou assim que foi eleito. Aproximou-se a passos largos do Governo. Fiel nas votações, jamais criou dificuldades aos interesses petistas.

A obediência política mostrou-se eficaz para quem pratica a política da boa vizinhança com o Poder. A Lei de isenção aos templos tem no parlamentar sua imagem simbólica.

Certamente, os frutos da gratidão do eleitorado, alheio aos detalhes da política, refletirão no futuro. Enquanto isso, muitos outros assuntos de interesses do Executivo continuarão a ser enviados ao Legislativo e claro, a gratidão parlamentar continuará valendo. Agora, oficializado por uma Lei.

Afinal, para muitos, o importante é receber os proveitos que o Poder pode proporcionar. Mas antes é preciso ceder aos interesses de quem tem o Poder na mão. O fisiologismo ainda alimenta a relação dos poderes que deveriam ser independentes, inclusive na prática.